Por André Querino
Antes de adentrarmos na questão, necessária é a explanação, ainda que resumida, acerca do crédito tributário.
A obrigação do contribuinte de pagar o tributo nasce com um procedimento administrativo documental, que é denominado lançamento (art. 142 do Código Tributário Nacional).
Uma vez verificados os aspectos relevantes e, dentre eles, o fato que gerou o dever de pagar, o contribuinte é obrigado a fazê-lo. Não o fazendo, ele dá ensejo ao ajuizamento de uma ação denominada Execução Fiscal, intentada pela União, Estados, Distrito Federal, Municípios e Autarquias respectivas, além dos Conselhos de Classe.
O procedimento judicial, relativo à Execução Fiscal, para a cobrança de valores de tributos não pagos, é contemplado pela Lei 6.830, editada em 22 de setembro de 1980, com a subsidiariedade do CPC.
E é justamente aí que reside o problema apontado nesta reflexão. O §1° do art. 16 da Lei 6.830/80, essencial à defesa do contribuinte (agora denominado como executado) é inconstitucional. A afronta aos Princípios do Contraditório e da Ampla Defesa é latente, pois o referido parágrafo condiciona a defesa à garantia do juízo.
Isso significa que o contribuinte só poderá apresentar sua defesa se: (i) depositou o valor devido em conta judicial; ou (ii) juntou ao processo a comprovação de fiança bancária ou do seguro garantia; (iii) se foi intimado da penhora que, por sua vez, implica em apreensão de um bem do contribuinte, que perde o poder de dele dispor.
Não obstante, a todos é garantido o Contraditório e a Ampla Defesa, princípios fundamentais conexos (art. 5º, LV, da CF), além do Livre Acesso à Justiça (art. 5º, XXXV, da CF).
O contraditório é o instrumento que viabiliza a defesa do cidadão em sua amplitude, garantindo-se a participação, livre e desimpedida, em âmbito procedimental, sustentando-se a possibilidade de influência das decisões judiciais, afastando eventuais surpresas ou atos inesperados.
A ampla defesa abarca um conjunto de meios moldados ao exercício do contraditório, correspondendo, portanto, à sua essência.
Essa abrangência principiológica é inerente ao direito de todo cidadão, e sua aplicação, em qualquer esfera – administrativa ou judicial –, decorre do Princípio da Isonomia (art. 5°, caput, da CF).
A manutenção da ordem jurídica se traduz na perene necessidade de afastar os vícios que maculam a sociedade. E é em favor da construção de uma sociedade livre, justa e solidária (artigo 1°, I, da CF/88), sustentada pelo Estado Democrático como um de seus pilares, que não se pode e não se deve admitir qualquer lesão aos princípios ora mencionados.
O direito procedimental tributário deve abarcar, portanto, um regramento coeso e coerente com o tratamento isonômico e consistente na lógica das diretrizes constitucionais.
É latente o fato de que o §1° do artigo 16 da Lei 6.830/80 é inconstitucional, ao passo que condiciona o direito de resposta, em detrimento da garantia do juízo.
Portanto, as regras devem ser harmônicas para que haja igualdade, oportunizando ao contribuinte – sobretudo aquele que não tem recursos –, em execução fiscal, se defender (embargar), sem nenhuma condição imposta.
Por fim, é importante salientar que o objetivo da presente reflexão é apontar a inconstitucionalidade do §1° do artigo 16 da Lei 6.830/80. Há pleno conhecimento de que, na prática, é perfeitamente possível afastar a Execução Fiscal por outros meios aptos, quando necessário.